Lei de Ferro da Oligarquia
A lei da necessidade histórica da oligarquia funda-se em primeiro lugar numa série de fatos fornecidos pela experiência. Como todas as outras leis científicas, as da sociologia decorrem da observação empírica.
Mas para tirar do nosso axioma seu caráter essencialmente descritivo e dar-lhe essa virtude de explicação analítica que por si transforma uma fórmula em lei, não basta restabelecer sob um ponto de vista unitário os fenômenos que podem ser constatados empiricamente: é preciso investigar as causas determinantes.
Abstraindo a tendência dos chefes em se organizarem e em se coligarem, abstraindo também seu reconhecimento às massas imóveis e passivas, nós podemos dizer que a principal causa dos fenômenos oligárquicos que se manifestam no seio dos partidos democráticos — e também dos sindicatos e de certos movimentos sociais — consiste no fato de que os chefes são tecnicamente indispensáveis.
O processo, que começou graças à diferenciação das funções do partido, foi concluído com a ajuda de um conjunto de qualidades que os chefes adquiriram pelo fato de terem se separado da massa. Os chefes que, no início, surgem “espontaneamente” e só exercem as funções de chefe a título “acessório” e gratuito tornam-se chefes profissionais. Esse primeiro passo logo vem seguido de um segundo, não tardando os chefes profissionais em tornarem-se chefes “estáveis e inamovíveis”.
O fenômeno oligárquico que se produz desse modo encontra em parte, portanto, uma explicação psicológica, isto é, que decorre das transformações psíquicas que as diferentes personalidades do partido sofrem ao longo de sua vida. Mas ele se explica também, e até mesmo em primeiro lugar, pelo que poderíamos chamar de “a psicologia da própria organização”, isto é, pelas necessidades de ordem tática e técnica que decorrem da consolidação de qualquer agregado político disciplinado.
Reduzida à sua mais breve expressão, a lei sociológica fundamental que rege inelutavelmente os partido políticos — dando à palavra “políticos” seu sentido mais abrangente — pode ser formulada assim: a organização é a fonte de onde nasce a dominação dos eleitos sobre os eleitores, dos mandatários sobre o mandantes, dos delegados sobre os que delegam. Quem diz organização, diz oligarquia.
Toda organização de partido representa uma potência oligárquica repousada sobre uma base democrática. Encontramos em toda parte eleitores e eleitos. Mas também encontramos em toda parte um poder quase ilimitado dos eleitos sobre as massas que elegem.
A constituição de oligarquias no seio das múltiplas formas de democracia é um fenômeno orgânico e por consequência uma tendência à qual sucumbe fatalmente toda organização. O jurista suíço Karl Ludwig von Haller já tinha observado que, sob toda forma de convivência social, a natureza cria por si mesma relações de dominação e de dependência.
A supremacia dos chefes nos partidos democráticos e revolucionários é um fato que deve ser levado em conta em qualquer situação histórica presente ou futura, mesmo que só alguns espíritos de elite tenham consciência clara e precisa disso.
Quanto aos meios imaginados para prevenir a oligarquia, a história demonstrou amplamente sua impotência e sua ineficácia. Todas as vezes que se quer resistir, através das leis, à dominação dos chefes, não são os chefes, mas as leis, que terminam por sucumbir e ceder.
Baseando-nos na incompetência fundiária das massas, nós somos, portanto, obrigados a reconhecer a existência de duas leis reguladoras: a tendência ideológica da democracia à crítica e ao controle e a contratendência efetiva da democracia à criação de partidos cada vez mais complexos e diferenciados, isto é, de partidos cada vez mais fundados na competência de uma minoria.
A massa nunca será soberana a não ser de uma forma abstrata. Por isso a pergunta que se faz não é a de saber de que maneira é possível realizar uma democracia ideal. Deve-se, sobretudo, perguntar até que ponto e em que medida a democracia é desejável, possível e realizável num momento determinado.
MICHELS, Robert [1914]. Sociologia dos partidos políticos. Brasília: Editora UnB, 1982.