Sociedade em Rede
Como tendência histórica, as funções e os processos dominantes na era da informação estão cada vez mais organizados em torno de redes. Redes constituem a nova morfologia social de nossas sociedades e a difusão da lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos processos produtivos e de experiência, poder e cultura.
Embora a forma de organização social em redes tenha existido em outros tempos e espaços, o novo paradigma da tecnologia da informação fornece a base material para sua expansão penetrante em toda a estrutura social. Além disso, essa lógica de redes gera uma determinação social em nível mais alto que a dos interesses sociais específicos expressos por meio das redes: o poder dos fluxos é mais importante que os fluxos do poder.
A presença na rede ou a ausência dela e a dinâmica de cada rede em relação às outras são fontes cruciais de dominação e transformação de nossa sociedade: uma sociedade que, portanto, podemos apropriadamente chamar de sociedade em rede, caracterizada pela primazia da morfologia social sobre a ação social. Rede é um conjunto de nós interconectados. Nó é o ponto no qual uma curva se entrecorta. Concretamente, o que um nó é depende do tipo de redes concretas de que falamos.
São mercados de bolsas de valores e suas centrais de serviços auxiliares avançados na rede dos fluxos financeiros globais. São conselhos nacionais de ministros e comissários europeus da rede política que governa a União Europeia. São campos de coca e de papoula, laboratórios clandestinos, pistas de aterrissagem secretas, gangues de rua e instituições financeiras para lavagem de dinheiro na rede de tráfico de drogas que invade as economias, sociedades e Estados no mundo inteiro. São sistemas de televisão, estúdios de entretenimento, meios de computação gráfica, equipes para cobertura jornalística e equipamentos móveis gerando, transmitindo e recebendo sinais na rede global da nova mídia no âmago da expressão cultural e da opinião pública, na era da informação.
A topologia definida por redes determina que a distância, ou intensidade e frequência da interação, entre dois pontos, ou posições sociais, é menor, ou mais frequente, ou mais intensa, se ambos os pontos forem nós de uma rede do que se não pertencerem à mesma rede.
Por sua vez, dentro de determinada rede os fluxos não têm nenhuma distância, ou a mesma distância, entre os nós. Portanto, a distância — física, social, econômica, política, cultural — para um determinado ponto ou posição varia entre zero, para qualquer nó da mesma rede, e infinito, para qualquer ponto externo à rede.
A inclusão/exclusão em redes e a arquitetura das relações entre redes, possibilitadas por tecnologias da informação que operam à velocidade da luz, configuram os processos e funções predominantes em nossas sociedades.
Redes são estruturas abertas capazes de expandir de forma ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmos códigos de comunicação — por exemplo, valores ou objetivos de desempenho. Uma estrutura social com base em redes é um sistema aberto altamente dinâmico suscetível de inovação sem ameaças ao seu equilíbrio.
Redes são instrumentos apropriados para a economia capitalista baseada na inovação, globalização e concentração descentralizada; para o trabalho, trabalhadores e empresas voltadas para a flexibilidade e adaptabilidade; para uma cultura de desconstrução e reconstrução contínuas; para uma política destinada ao processamento instantâneo de novos valores e humores públicos; e para uma organização social que vise a suplantação do espaço e invalidação do tempo.
Mas a morfologia da rede também é uma fonte de drástica reorganização das relações de poder. As conexões que ligam as redes — por exemplo, fluxos financeiros assumindo o controle de impérios da mídia que influenciam os processos políticos — representam os instrumentos privilegiados do poder. Assim, os conectores são os detentores do poder.
Uma vez que as redes são múltiplas, os códigos interoperacionais e as conexões entre redes tornam-se as fontes fundamentais da formação, orientação e desorientação das sociedades. A convergência da evolução social e das tecnologias da informação criou uma nova base material para o desempenho de atividades em toda a estrutura social. Essa base material construída em redes define os processos sociais predominantes, consequentemente dando forma à própria estrutura social.
A nova economia está organizada em torno de redes globais de capital, gerenciamento e informação cujo acesso a saber-fazer tecnológico é importantíssimo para a produtividade e competitividade. Empresas comerciais e, cada vez mais, organizações e instituições são estabelecidas em redes de geometria variável cujo entrelaçamento suplanta a distinção tradicional entre empresas e pequenos negócios, atravessando setores e espalhando-se por diferentes agrupamentos geográficos de unidades econômicas.
Assim, o processo de trabalho é cada vez mais individualizado e a mão de obra está desagregada no desempenho e reintegrada no resultado através de uma multiplicidade de tarefas interconectadas em diferentes locais, introduzindo uma nova divisão de trabalho mais baseada nos atributos/capacidades de cada trabalhador que na organização da tarefa.
CASTELLS, Manuel [1996]. A sociedade em rede. A era da informação: economia, sociedade e cultura. Volume 1. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
Capitalismo em Rede
A sociedade em rede, em suas várias expressões institucionais, por enquanto é uma sociedade capitalista. Ademais, pela primeira vez na história, o modo capitalista de produção dá forma às relações sociais em todo o planeta.
Mas esse tipo de capitalismo é profundamente diferente de seus predecessores históricos. Tem duas características distintas fundamentais: é global e está estruturado, em grande medida, em uma rede de fluxos financeiros. O capital funciona globalmente como uma unidade em tempo real; e é percebido, investido e acumulado principalmente na esfera de circulação, isto é, como capital financeiro.
Embora o capital financeiro, em geral, estivesse entre as frações dominantes do capital, estamos testemunhando a emergência de algo diferente: a acumulação de capital prossegue e sua realização de valor é cada vez mais gerada nos mercados financeiros globais estabelecidos pelas redes de informação no espaço intemporal de fluxos financeiros.
A partir dessas redes o capital é investido por todo o globo e em todos os setores de atividade: informação, negócios de mídia, serviços avançados, produção agrícola, saúde, educação, tecnologia, indústria antiga e nova, transporte, comércio, turismo, cultura, gerenciamento ambiental, bens imobiliários, práticas de guerra e de paz, religião, entretenimento e esportes.
Algumas atividades são mais lucrativas que outras, conforme vão passando por ciclos, altos e baixos do mercado e concorrência global segmentada. No entanto, qualquer lucro — de produtores, consumidores, tecnologia, natureza e instituições — é revertido para a metarrede de fluxos financeiros, na qual todo o capital é equalizado na democracia da geração de lucros transformada em commodities.
Nesse cassino global eletrônico capitais específicos elevam-se ou diminuem drasticamente, definindo o destino de empresas, poupanças familiares, moedas nacionais e economias regionais. O resultado na rede é zero: os perdedores pagam pelos ganhadores. Mas os ganhadores e os perdedores vão mudando a cada ano, a cada mês, a cada dia, a cada segundo e permeiam o mundo das empresas, empregos, salários, impostos e serviços públicos.
O mundo daquilo que, às vezes, é chamado de "a economia real", e eu seria tentado a chamar de "a economia irreal", já que, na era do capitalismo em rede, a realidade fundamental em que o dinheiro é ganho e perdido, investido ou poupado, está na esfera financeira. Todas as outras atividades — exceto as do setor público em fase de enxugamento — são primariamente a base de geração do superávit necessário para o investimento nos fluxos globais ou o resultado do investimento originado nessas redes financeiras.
Contudo, para sua operação e concorrência, o capital financeiro depende do conhecimento e da informação gerados e aperfeiçoados pela tecnologia da informação. Esse é o significado concreto da articulação entre o modo capitalista de produção e o modo informacional de desenvolvimento. Assim, o capital que seria meramente especulativo é submetido a risco excessivo e, em última análise, removido pela simples probabilidade estatística dos movimentos aleatórios dos mercados financeiros.
É na interação entre o investimento em empresas lucrativas e o uso dos lucros acumulados para fazê-los frutificar nas redes financeiras globais que o processo de acumulação se baseia. Portanto, depende da produtividade, da competitividade e da informação adequada sobre investimento e planejamento de longo prazo de cada setor. Empresas de alta tecnologia dependem de recursos financeiros para manter seu esforço contínuo pela inovação, produtividade e competitividade.
O capital financeiro, atuando diretamente por meio de instituições financeiras ou de forma indireta mediante a dinâmica dos mercados das bolsas de valores, condiciona o destino das indústrias de alta tecnologia. Por sua vez, a tecnologia e a informação são ferramentas decisivas para a geração de lucros e apropriação de fatias do mercado. Assim, o capital financeiro e a alta tecnologia, o capital industrial, estão cada vez mais interdependentes, mesmo quando seus modos operacionais são específicos a cada setor.
O capital é global ou se torna global para entrar no processo de acumulação da economia em rede eletrônica. As empresas se organizam cada vez mais em redes, tanto internamente como em seus relacionamentos. Então, o capital flui e suas atividades induzidas de produção-gerenciamento-distribuição espalham-se por redes interconectadas de geometria variável.
CASTELLS, Manuel [1996]. A sociedade em rede. A era da informação: economia, sociedade e cultura. Volume 1. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
Capitalistas em Rede
Os administradores controlam empresas e segmentos específicos da economia global, mas não controlam e nem sequer conhecem os movimentos sistêmicos reais de capital nas redes de fluxos financeiros, nem os movimentos de conhecimento nas redes de informação, nem os de estratégias no conjunto multifacetado de empresas integradas em rede.
Alguns atores no topo deste sistema capitalista global, de fato, são administradores, como no caso das empresas japonesas. Outros ainda poderiam ser identificados na categoria tradicional da burguesia como nas redes de empresas chinesas no exterior, que mantêm ligação cultural, frequentemente por meio de relação pessoal ou familiar, compartilham valores e, às vezes, conexões políticas.
Nos Estados Unidos, uma mistura de camadas históricas faz dos capitalistas um rico conjunto de banqueiros tradicionais, especuladores novos ricos, empreendedores que se transformaram em gênios, magnatas globais e administradores de multinacionais. Em outros casos, empresas públicas — como no setor francês de bancos ou de produtos eletrônicos.
Na Rússia, os sobreviventes da nomenklatura comunista competem com os jovens capitalistas selvagens na reciclagem da propriedade estatal na constituição da mais nova província capitalista. E em todo o mundo, a lavagem de dinheiro de negócios criminosos diversos flui para esta mãe de toda a acumulação que é a rede financeira global.
Assim, todos esses são capitalistas, norteando todos os tipos de economias e a vida das pessoas. Mas uma classe capitalista? Social e economicamente não existe uma classe capitalista global. Há, no entanto, uma rede integrada de capital global, cujos movimentos e lógica variável determinam as economias e influenciam as sociedades.
Dessa forma, acima de vários capitalistas de carne e osso e grupos capitalistas, há uma entidade capitalista coletiva sem rosto, formada de fluxos financeiros operados por redes eletrônicas. Não é apenas a expressão da lógica abstrata do mercado porque, na realidade, não segue a lei da oferta e da procura: responde às turbulências e aos movimentos imprevisíveis, de expectativas não calculáveis induzidas pela psicologia e sociedade na mesma medida que pelos processos econômicos.
Essa rede das redes de capital unifica e comanda centros específicos de acumulação capitalista, estruturando o comportamento de capitalistas mediante sua submissão à rede global. Eles usam suas estratégias competitivas ou convergentes nos circuitos dessa rede global e, portanto, em última análise, dependem da lógica capitalista não humana de um processo de informação aleatório operado eletronicamente.
Na verdade, é o capitalismo em sua pura expressão da busca constante do dinheiro pelo dinheiro por intermédio da produção de commodities por commodities. Mas o dinheiro tornou-se quase totalmente independente da produção, inclusive da produção de serviços, fugindo pelas redes de interações eletrônicas mais sofisticadas dificilmente entendidas pelos gerentes de produção.
Embora o capitalismo ainda impere, os capitalistas em si estão distribuídos de forma aleatória, e as classes capitalistas ficam restritas às áreas específicas do mundo onde prosperam como apêndices de um poderoso turbilhão que manifesta sua vontade mediante pontos de spread e classificações de opções de futuros nos flashes globais das telas de computadores.
CASTELLS, Manuel [1996]. A sociedade em rede. A era da informação: economia, sociedade e cultura. Volume 1. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
Trabalhadores em Rede
O que acontece à mão de obra e às relações sociais de produção neste admirável mundo novo do capitalismo informacional global? Trabalhadores não desaparecem no espaço de fluxos e, do ponto de vista prático, há muito trabalho. Na verdade, contradizendo profecias apocalípticas de análises simplistas, há mais empregos e uma proporção maior de pessoas com idade para o trabalho empregadas que em qualquer outra época da história.
Isso ocorre principalmente por causa da incorporação maciça das mulheres no mercado de trabalho remunerado em todas as sociedades industrializadas, incorporação que, em geral, tem sido absorvida e, em grande medida, induzida pelo mercado de trabalho sem maiores rupturas.
Portanto, a difusão das tecnologias da informação, embora, sem dúvida, dispense trabalhadores e elimine alguns postos de trabalho, não resultou e provavelmente não resultará em desemprego em massa no futuro previsível. Isto, apesar do aumento de desemprego nas economias europeias, tendência mais relacionada com as instituições sociais que com o novo sistema produtivo.
Mas, se trabalho, trabalhadores e classes trabalhadoras existem e até se expandem em todo o mundo, as relações sociais entre capital e trabalho sofreram uma transformação profunda. Na essência, o capital é global. Via de regra, o trabalho é local.
O informacionalismo, em sua realidade histórica, leva à concentração e globalização do capital exatamente pelo emprego do poder descentralizador das redes. A mão de obra está desagregada em seu desempenho, fragmentada em sua organização, diversificada em sua existência, dividida em sua ação coletiva.
As redes convergem para uma metarrede de capital que integra os interesses capitalistas em âmbito global e por setores e esferas de atividades: não sem conflito, mas sob a mesma lógica abrangente. Os trabalhadores perdem sua identidade coletiva, tornam-se cada vez mais individualizados quanto a suas capacidades, condições de trabalho, interesses e projetos.
Distinguir quem são os proprietários, os produtores, os administradores e os empregados está ficando cada vez mais difícil em um sistema produtivo de geometria variável, trabalho em equipe, atuação em redes, terceirização e subcontratação. Há unidade no processo de trabalho em todas as complexas redes globais de interação. Mas, ao mesmo tempo, existe diferenciação de trabalho, segmentação de trabalhadores e desagregação de mão de obra em escala global.
Portanto, embora as relações capitalistas de produção ainda persistam — na verdade, em muitas economias a lógica dominante é mais estritamente capitalista do que antes —, capital e trabalho tendem cada vez mais a existir em diferentes espaços e tempos: o espaço dos fluxos e o dos lugares, tempo instantâneo de redes computadorizadas versus tempo cronológico da vida cotidiana.
Dessa forma, eles vivem lado a lado sem se relacionarem, à medida que a existência do capital global depende cada vez menos do trabalho específico e cada vez mais do trabalho genérico acumulado, operado por um pequeno grupo de cérebros que habita os palácios virtuais das redes globais.
Além dessa dicotomia fundamental, ainda existe muita diversidade social formada de ofertas de investidores, esforços de trabalhadores, ingenuidade e sofrimento humanos, contratações e dispensas de empregados, promoções e rebaixamentos, conflitos e negociações, concorrência e alianças: a vida ligada ao trabalho continua.
Mas, em nível mais profundo da nova realidade social, as relações sociais de produção foram desligadas de sua existência real. O capital tende a fugir em seu hiperespaço de pura circulação, enquanto os trabalhadores dissolvem sua entidade coletiva em uma variação infinita de existências individuais.
Nas condições da sociedade em rede, o capital é coordenado globalmente, o trabalho é individualizado. A luta entre diferentes capitalistas e classes trabalhadoras heterogêneas está incluída na oposição mais fundamental entre a lógica pura e simples dos fluxos de capital e os valores culturais da experiência humana.
CASTELLS, Manuel [1996]. A sociedade em rede. A era da informação: economia, sociedade e cultura. Volume 1. São Paulo: Paz e Terra, 2011.