Redistribuição e Reconhecimento
Lutas de reconhecimento assumem com frequência a forma de chamar a atenção para a presumida especificidade de algum grupo — ou mesmo de criá-la performativamente — e, portanto, afirmar seu valor. Desse modo, elas tendem a promover a diferenciação do grupo.
Lutas de redistribuição, em contraste, buscam com frequência abolir os arranjos econômicos que embasam a especificidade do grupo. Desse modo, elas tendem a promover a desdiferenciação do grupo.
O resultado é que a política do reconhecimento e a política da redistribuição parecem ter com frequência objetivos mutuamente contraditórios.
Enquanto a primeira tende a promover a diferenciação do grupo, a segunda tende a desestabilizá-la. Desse modo, os dois tipos de luta estão em tensão; um pode interferir no outro, ou mesmo agir contra o outro.
Pessoas sujeitas à injustiça cultural e à injustiça econômica necessitam de reconhecimento e redistribuição. Necessitam de ambos para reivindicar e negar sua especificidade. Essas coletividades são “bivalentes”.
São diferenciadas como coletividades tanto em virtude da estrutura econômico-política quanto da estrutura cultural-valorativa da sociedade. Oprimidas, portanto, sofrem injustiças que remontam simultaneamente à economia política e à cultura.
Gênero e raça são paradigmas de coletividades bivalentes. Embora cada qual tenha peculiaridades não compartilhadas pela outra, ambas abarcam dimensões econômicas e dimensões cultural-valorativas. Gênero e raça, portanto, implicam tanto redistribuição quanto reconhecimento.
O gênero, por exemplo, tem dimensões econômico-políticas porque é um princípio estruturante básico da economia política.
Por um lado, o gênero estrutura a divisão fundamental entre trabalho “produtivo” remunerado e trabalho “reprodutivo” e doméstico não remunerado, atribuindo às mulheres a responsabilidade primordial por este último.
Por outro lado, o gênero também estrutura a divisão interna ao trabalho remunerado entre as ocupações profissionais e manufatureiras de remuneração mais alta, em que predominam os homens, e ocupações de “colarinho rosa” e de serviços domésticos, de baixa remuneração, em que predominam as mulheres.
O resultado é uma estrutura econômico-política que engendra modos de exploração, marginalização e privação especificamente marcados pelo gênero.
Esta estrutura constitui o gênero como uma diferenciação econômico-política dotada de certas características de classe. Sob esse aspecto, a injustiça de gênero aparece como uma espécie de injustiça distributiva que clama por mudanças redistributivas.
Entretanto, o gênero não é somente uma diferenciação econômico-política, mas também uma diferenciação de valoração cultural.
Como tal, ele também abarca elementos que se assemelham mais à sexualidade do que à classe, e isso permite enquadrá-lo na problemática do reconhecimento.
Seguramente, uma característica central da injustiça de gênero é o androcentrismo: a construção autorizada de normas que privilegiam os traços associados à masculinidade.
Em sua companhia está o sexismo cultural: a desqualificação generalizada das coisas codificadas como “femininas”, paradigmaticamente — mas não só —, as mulheres.
Essa desvalorização se expressa numa variedade de danos sofridos pelas mulheres, incluindo a violência e a exploração sexual, a violência doméstica generalizada; as representações banalizantes, objetificadoras e humilhantes na mídia; o assédio e a desqualificação em todas as esferas da vida cotidiana; a sujeição às normas androcêntricas, que fazem com que as mulheres pareçam inferiores ou desviantes e que contribuem para mantê-las em desvantagem, mesmo na ausência de qualquer intenção de discriminar; a discriminação atitudinal; a exclusão ou marginalização das esferas públicas e centros de decisão; e a negação de direitos legais plenos e proteções igualitárias.
O gênero é, em suma, um modo bivalente de coletividade. Ele contém uma face de economia política, que o insere no âmbito da luta de redistribuição. Mas também uma face cultural-valorativa, que simultaneamente o insere no âmbito da luta de reconhecimento.
FRASER, Nancy. Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da justiça numa era “pós-socialista”. Cadernos de Campo, São Paulo, n. 14/15, 2006.
Enem 2019b - 51
a) redefine a dinâmica das instituições sociais.
b) limita os mecanismos de inclusão das minorias.
c) constrói a segregação dos segmentos populares.
d) abala a relação da classe dominante com o Estado.
e) subverte os direitos de determinadas parcelas da sociedade.
a) redefine a dinâmica das instituições sociais.
Enem 2016b - 34
a) aumento da renda nacional.
b) mobilização do movimento negro.
c) melhoria da infraestrutura escolar.
d) ampliação das disciplinas obrigatórias.
e) politização das universidades públicas.
b) mobilização do movimento negro.
Enem 2017b - 83
a) afirmação identitária.
b) organização sindical.
c) formação profissional.
d) participação partidária.
e) manifestação religiosa.
a) afirmação identitária.